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25 de Abril de 2024
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    Metade dos processos no TJRJ é gratuita

    Moradora do Morro dos Macacos, em Vila Isabel – Zona Norte do Rio -- a doméstica Edna Ezequiel, de 43 anos, ganhou fama depois que teve o retrato publicado nos sites de notícias, há dez anos, chorando, olhar perdido, levando no braço esquerdo pulseiras verde e amarela. Ela busca indenização do Estado por danos morais em razão do assassinato da filha, Alana, aos 7 anos, vítima de bala perdida num confronto entre policiais e traficantes. Moradora de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, a copeira aposentada Luiza Helena, 63 anos, luta pela pensão alimentícia do neto de 15 anos de idade. E o auxiliar de serviços gerais Mário Johnson, de 38 anos, recorreu à Justiça para obter a guarda da filha de oito anos.

    Em comum, os três personagens desta história têm não apenas o fato de que são pobres, mas que pediram e conseguiram usufruir do maior instrumento de democratização da Justiça brasileira: a gratuidade. Eles fazem parte das milhares de pessoas que anualmente recorrem à aplicação da Lei 1.060, de 1950, que permite o acesso aos serviços do Poder Judiciário sem desembolsar um tostão sequer, desde que comprovem a insuficiência de recursos. No Tribunal de Justiça do Estado do Rio, as estatísticas indicam que pelo menos 50% dos processos em andamento são alcançados pela gratuidade, com exceção dos casos na Dívida Ativa. Em alguns períodos, esse índice pode atingir os 60%. Em maio passado, o número de processos com gratuidade em andamento atingiu a marca de 1.774.398. A maior incidência está nas Varas Cíveis (414.419) e nas Varas de Família (279.249). Só nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, onde a gratuidade é total, os números chegam respectivamente a 659.235 e 146.540.

    -- A gratuidade é a essência do direito fundamental constitucional de garantia de acesso à Justiça – afirma Marcelo Oliveira da Silva, juiz-auxiliar da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado.

    A grande maioria dos processos com gratuidade tem origem na Defensoria Pública do Estado do Rio, órgão encarregado de oferecer, de forma integral e gratuita, assistência e orientação jurídica aos cidadãos que não têm condições financeiras de pagar por aqueles serviços. Como as pessoas mais pobres são justamente aquelas com menor acesso a informações, é grande o desafio do poder público de difundir os dados sobre as condições de gratuidade na Justiça.

    Tanto a copeira Luiza Helena como o auxiliar de serviços gerais Mário Johnson reconhecem que já tinham ouvido falar em “Justiça Gratuita”, mas não ligavam o nome à “pessoa”. Como saber exatamente se tem direito a pedir a gratuidade? E será que um processo na Justiça Gratuita não demora mais para chegar a uma sentença? Pergunta daqui, pergunta dali, eles chegaram ao telefone 129, a Central de Atendimento da Defensoria, que funciona de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h. Chove ligação.

    -- Graças a Deus, meu processo está andando bem, talvez até mais veloz do que se eu tivesse dinheiro para pagar advogado – conta dona Luiza.

    Aposentada, com renda mensal de pouco mais de um salário mínimo, dona Luiza lembra que foi fácil comprovar que não tinha recursos para pagar as custas judiciais, que incluem taxas e emolumentos, até a realização de perícias feitas por profissionais como médicos e contadores, além de exames diversos. Nesse quesito, o campeão de audiência é o exame de DNA, que permite tirar dúvidas até mesmo existenciais do tipo “de onde vim”. Só com esse tipo de exame, o Tribunal de Justiça arca com uma despesa de R$ 5 milhões por ano nos casos de gratuidade. Dona Luiza mesmo foi beneficiada por essa medida.

    -- Minha filha morreu mas me disse antes quem era o pai de um de seus filhos. O pai negava, negava. Mas eu pedi ajuda à Defensoria, entramos na Justiça Gratuita. O exame de DNA comprovou que o rapaz é o pai mesmo. Agora, estamos na luta para que ele pague pensão alimentícia pro menino – conta dona Luiza, que de outra forma não teria como custear um exame de comprovante de paternidade (o preço de um exame desses varia entre R$ 350 e R$ 1 mil).

    Assim como dona Luiza, a doméstica Edna Ezequiel conseguiu recorrer à gratuidade de Justiça por intermédio de seu advogado, Cacau de Brito. Mãe da menina Alana, vítima de bala perdida no Morro dos Macacos, em 2007, Edna ganhou contra o Estado ação de indenização por danos morais, que inclui pensão mensal de um salário mínimo a partir da data da morte da filha até o ano em que ela completaria 25 anos de idade, em 2025.

    -- Agora estou mais perto do sonho de comprar uma casa fora da comunidade, onde perdi minha filha – observa Edna.

    Instituída por lei do século passado, que estabelece normas para a concessão de assistência jurídica aos necessitados, de 5 de fevereiro de 1950, a gratuidade de Justiça foi confirmada pelo Artigo 5, inciso LXXIV da Constituição Federal de 1988: “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. O benefício foi incorporado também pelo novo Código de Processo Civil, em vigor desde março passado. Pelo texto da lei, podem pedir a gratuidade de Justiça, mesmo com a contratação de um advogado particular, a pessoa física ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios. (caput do art. 98 do CPC). Juristas já apresentam até jurisprudência, que permite que o benefício seja concedido por juiz mesmo sem requisição da parte. “É dever do Estado prestar assistência judiciária integral e gratuita, razão pela qual, nos termos da jurisprudência do STJ, permite-se a sua concessão ex officio. (STJ – 6ª Turma – REsp 320.019/RS – Relator Ministro Fernando Gonçalves, decisão: 05-03-2002)”.

    Polêmicas à parte, a gratuidade de Justiça pode ser indeferida pelo juiz se a parte não comprovar a insuficiência de recursos para arcar com as custas do processo. Em geral, os juízes costumam ser rigorosos na exigência dos comprovantes, já que sempre há quem tente burlar a lei. A Defensoria Pública consegue o deferimento em 90% dos processos. E os defensores costumam recorrer quando a gratuidade é negada. Quando a gratuidade é deferida, é o Tribunal de Justiça que assume os custos. Os valores são difíceis de se calcular, já que as custas são pagas com base no valor de cada causa. Estes recursos são provenientes do Fundo Especial do TJ, que é constituído pelas custas processuais. O fundo garante os programas sociais desenvolvidos pelo Tribunal. Só no passado, foram investidos mais de R$ 720 milhões nesses programas.

    Um desses programas é o da gratuidade de Justiça. E só por essa forma que o auxiliar de serviços gerais Mário Johnson conseguiu iniciar a luta pela guarda da filha de 8 anos. Paraibano de Mojeiro, radicado no Rio desde 2000, Mário se emociona ao lembrar que desde 2015 tem em andamento o processo para legalizar a guarda da filha, depois que se separou da mãe dela. Bastante apegada ao pai, a menina já está com ele há três anos, enquanto a Justiça tenta localizar a mãe. “Sem a Justiça gratuita eu não teria a menor chance de ficar com o maior tesouro da minha vida”, diz Mário.

    Como ter acesso à Justiça Gratuita

    O direito à gratuidade de Justiça necessita de comprovação da insuficiência de recursos. Para isso, o interessado deve solicitar a seu advogado ou recorrer à Defensoria Pública do Estado do Rio, pelo telefone 129 ou por formulário no atendimento do site da entidade. Os documentos exigidos são:

    - CPF

    - Identidade

    - Comprovante de residência

    - Três últimos contracheques e carteira de trabalho

    - Três últimos extratos bancários

    - Declaração mais recente de imposto de renda ou declaração de isento

    JAB/AB

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