11 de Agosto de 2022
- 2º Grau
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Inteiro Teor
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
1
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
APELANTE: LIGHT SERVIÇOS DE ELETRICIDADE S/A
APELADA: CLÁUDIA LIBERATORI DE OLIVEIRA
RELATORA: DESEMBARGADORA DENISE NICOLL SIMÕES
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
ENERGIA ELÉTRICA. ALEGAÇÃO DE COBRANÇA
EXCESSIVA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DA RÉ. Trata-se de ação em que a Autora
afirma ter recebido as faturas com vencimento nos
meses de março a julho de 2019 e maio a julho de
2020 em valores muito elevados, não condizentes com
o consumo de energia elétrica habitual em sua
residência. Prova documental que atesta a disparidade
entre o valor cobrado no período questionado e a
média dos meses anteriores e posteriores.
Concessionária que não comprova a regularidade das
cobranças, ônus que lhe cabia na forma do art. 373,
inciso II do CPC e do § 3º do art. 14 do CDC. A
Apelante efetuou cobranças indevidas, o que não pode
ser configurado como aborrecimento cotidiano ou
inadimplemento contratual. Dano moral configurado.
Valor de R$ 10.000,00 que se mostra elevado, devendo
ser reduzido para R$ 5.000,00, que melhor se coaduna
com a hipótese em comento. Precedentes desta Corte.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos da Apelação Cível nº 004767126.2019.8.19.00203 , ACORDAM os Desembargadores que integram a 5ª Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, POR UNANIMIDADE DAR PARCIAL
PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ , nos termos do voto da Relatora.
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
2
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pela Ré da sentença que
julgou procedente o pedido autoral para, confirmando a decisão que deferiu a
antecipação dos efeitos da tutela, determinar que a Ré se abstivesse de interromper
o serviço na unidade da Autora, declarando a quitação das faturas impugnadas, e
condenando a Concessionária ao pagamento de indenização por danos morais no
valor de R$ 10.000,00 e à emissão de faturas no valor de R$ 75,00 até que fosse
efetuada a troca do medidor na residência da Autora.
A Autora narra, em síntese, que é cliente da Ré e que o consumo de
sua residência sempre se manteve em torno de R$ 75,00.
Relata que, sem aviso ou seu consentimento, em março/2019, a Ré
trocou seu medidor trifásico por outro monofásico e, após tal medida, a conta
imediatamente seguinte veio no valor de R$ 503,83 e as demais igualmente
apresentaram cobranças exorbitantes.
Conta que entrou em contato com a Ré, sendo informada de que as
cobranças estavam corretas e deveriam ser pagas, porém alega que não possui
condições financeiras de arcar com tais valores.
Prossegue em sua narrativa aduzindo que ajuizou ação anterior em
face da Concessionária (nº XXXXX-31.2017.8.19.0203), na qual foi deferido o
pagamento apenas do que foi consumido retirando os parcelamentos aleatórios
realizados pela Ré, esclarecendo que reside em um pequeno imóvel somente com
seu filho, passando boa parte do dia fora de casa.
Requer a gratuidade de justiça e a concessão da tutela de urgência
para que a Ré se abstenha de interromper o serviço em sua unidade e de efetuar
qualquer cobrança a título de recuperação de consumo; a posterior confirmação da
decisão que deferir a tutela de urgência; a troca do medidor; o cancelamento das
contas de março a julho de 2019; o refaturamento das contas com base no mínimo
ou no valor do consumo real; indenização por danos morais no valor de R$
10.000,00.
Deferida a gratuidade de justiça na decisão index 00038.
Decisão index 00099 deferindo a tutela de urgência para determinar
que a Ré se abstivesse de suspender o serviço na unidade da Autora e
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
3
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
determinando que esta depositasse em juízo no valor de R$ 75,00 os meses
questionados.
Contestação (índex 00111) na qual a Ré argui preliminar de
litispendência. No mérito, sustenta, em síntese, que as cobranças impugnadas estão
corretas e refletem o efetivo consumo de energia elétrica da unidade, sendo
descabida a revisão das faturas e devolução de valores pagos.
Sustenta que, em exercício regular de direito, constatou defeito no
medidor da Autora, visto que o aparelho cobrava apenas o custo de disponibilidade
e que, após a troca do medidor, o consumo passou a ser regularmente faturado.
Aduz que o medidor da unidade foi aferido, não sendo encontrada
qualquer irregularidade; que o consumo de energia aferido é linear, apresentando
pequenas variações dentro da normalidade, e que diversos fatores podem contribuir
para tal oscilação, tais como número de pessoas e de eletrodomésticos, fuga de
energia etc.
Defende que o eventual descumprimento contratual não é capaz de
ensejar dano moral, refutando o pedido de indenização.
Petição da Autora informando não ter mais provas a produzir (index
00200 e réplica no index 00202.
A Ré se manifestou em provas no index 00205, informando não ter
mais provas a produzir.
O Juízo da 1ª Vara da Comarca da Regional de Jacarepaguá prolata
sentença, da qual se destaca o dispositivo (índex 00221):
“[...] Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido na forma
do art. 487, inciso I do Novo Código de Processo Civil,
para CONFIRMAR a decisão inicial que concedeu a tutela
de urgência em favor da Autora, tornando a definitiva.
DECLARAR a quitação das faturas referentes aos meses
março/19, abril/19, maio/19, maio/20, junho/20/julho/20.
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
4
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
CONDENAR a Ré a título de dano moral no valor de R$
10.000,00 (dez mil reais), corrigidos monetariamente na
forma da Lei 6.899/81 a partir da presente data, com juros
legais de 1 % (um por cento) ao mês (art. 406 do Código
Civil de 2002 c/c Enunciado nº 20 CJF), contados a partir
da citação.
OBRIGAR a Ré a cobrar as faturas mensais tendo como
média mensal o valor de R$75,00 (setenta e cinco reais),
enquanto não realizar a troca do medidor por outro
trifásico, sob pena de multa mensal que FIXO no valor de
R$ 10.000,00 (dez mil reais), podendo eventualmente ser
majorada ou reduzida.
DETERMINAR a expedição de mandado de pagamento
dos valores depositados pela Autora em favor da Ré.
CONDENAR a Ré ao pagamento das custas processuais
e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por
cento), sobre o valor da condenação. P.I.”
Apelação da Ré (índex 00254), reiterando as alegações de mérito da
contestação, em especial a de regularidade das cobranças.
Requer o “acolhimento da prejudicial de mérito” com a extinção do
feito; a anulação da sentença para que outra seja prolatada com a devida
fundamentação; a reforma da sentença com a improcedência dos pedidos, e,
subsidiariamente, a redução da indenização por danos morais e fixação dos juros de
mora sobre eles incidentes a partir do arbitramento.
Contrarrazões no index 00271.
VOTO
Em juízo de admissibilidade, reconheço a presença dos requisitos
extrínsecos e intrínsecos, imprescindíveis à interposição do recurso.
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
5
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
Trata-se de ação em que a Autora afirma que, após a instalação de
novo medidor, passou a receber faturas de cobrança do serviço prestado pela Ré
em valores muito superiores à sua média de consumo no período de fevereiro a
junho de 2016.
A sentença julgou procedentes os pedidos, declarado a quitação das
faturas impugnadas e condenando a Ré a pagar indenização por danos morais no
valor de R$ 10.000,00.
Recorre a Ré defendendo, em síntese, a legalidade das cobranças e
a inexistência de danos morais a serem indenizados.
De início, destaco que, embora em seus pedidos a Apelante
mencione acolhimento de prejudicial de mérito e peça anulação da sentença, não
há no recurso qualquer fundamentação que embase tais pleitos, de modo que
deixo de conhece-los.
A questão trazida a julgamento evidencia uma relação de consumo
nos moldes dos artigos 2º e 3º do CDC motivo pelo qual, a demanda será julgada
consoante os princípios e normas do Código de Defesa e Proteção ao
Consumidor.
Do cotejo dos autos, verifica-se que a Autora acostou à inicial as
faturas de energia elétrica cujos débitos questiona, e apresentou as dos meses
anteriores à primeira cobrança que defende ser excessiva, demonstrando que de
março a maio de 2019 a cobrança pelo consumo foi faturada em valor
relativamente superior à daquele que os antecedeu.
Com efeito, verifica-se que o consumo desses meses foi cobrado em
montante discrepante da média da unidade residencial e com aquelas
apresentadas nos meses anteriores (index 00022) à primeira cobrança elevada.
Há de se mencionar que a Concessionária tinha condições de
comprovar a legitimidade das cobranças, o que não ocorreu, pois não pugnou
pela prova pericial, prova essa imprescindível ao deslinde da questão apreciada.
Ainda nesse contexto, imperioso pontuar que, não obstante a Ré
alegue a linearidade das leituras de consumo, observa-se da tela acostada pela
própria parte em sua contestação que há grandes disparidades na apuração de
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
6
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
consumo da unidade da Autora, o que nos leva a crer, como bem apontado pelo
Juízo sentenciante, que o problema está no sistema de medição da Recorrente.
Constata-se que a Concessionária-ré apenas limitou-se a afirmar a
legitimidade da cobrança, porém não comprova tal alegação, ônus que lhe cabia,
na forma do art. 373, inciso II do CPC.
Dessa forma, forçoso concluir pela irregularidade da cobrança nos
meses impugnados, devendo ser mantida a declaração de quitação, conforme
estipulado na sentença, visto que foi efetuado pela Autora o depósito nos autos
dos valores correspondentes à média de consumo e determinada a expedição de
mandado de pagamento em favor da Concessionária.
Restou, portanto, incontroversa a falha na prestação do serviço pela
Ré, consubstanciada na emissão de faturas de consumo em valor indevido.
Uma vez configurada a cobrança indevida, submetendo a Apelada a
uma indiscutível condição de impotência, é, pois, inequívoco que tal situação
extrapolou o mero aborrecimento cotidiano.
A quebra da legítima expectativa quanto à correção e à qualidade da
prestação do serviço ultrapassa o inadimplemento contratual, constituindo
violação da lei e ofensa aos princípios da bo -fé objetiva, da segurança e da
confiança, configurando dano moral por violação do direito da personalidade.
Incide, pois, o dever de reparar. No entanto, entendo que o valor de
R$ 10.000,00 se mostra elevado, devendo ser reduzido R$ 5.000,00 (cinco mil
reais), que se mostra mais razoável e proporcional aos fatos narrados na exordial,
e se coaduna com as peculiaridades do caso concreto, compatível com a
reprovabilidade da conduta, com a extensão do dano sofrido e o caráter punitivo
pedagógico do instituto, merecendo acolhida o recurso nesse ponto.
Confira-se o entendimento desta Corte no mesmo sentido:
“XXXXX-83.2016.8.19.0208 – APELAÇÃO - Des (a).
WILSON DO NASCIMENTO REIS - Julgamento:
08/07/2021 - VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL -APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
7
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
DECLARATÓRIA C/C DANOS MORAIS. RELAÇÃO
DE CONSUMO. LIGHT. ENERGIA ELÉTRICA.
ALEGAÇÃO DE COBRANÇA ACIMA DO CONSUMO
MÉDIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. EMPRESA
RÉ QUE NÃO DEMONSTROU A REGULARIDADE DA
COBRANÇA. REFATURAMENTO DA COBRANÇA.
CONCESSIONÁRIA RÉ QUE NÃO SE DESINCUMBIU
DO ÔNUS QUE LHE CABIA. DANOS MORAIS
CONFIGURADOS, EIS QUE OS FATOS NARRADOS
ULTRAPASSARAM O MERO ABORRECIMENTO.
AUTORA QUE TEVE QUE SE SUBMETER AO
INCREMENTO INDEVIDO. PERDA DE SEU TEMPO
ÚTIL PARA O AJUIZAMENTO DESTA AÇÃO.
SENTENÇA MANTIDA. 1. Trata-se de demanda onde a
parte autora alega falha na prestação do serviço da
parte ré, tendo em vista a cobrança excessiva no mês
de junho de 2016 que foge da realizada, bem como de
sua média de consumo, buscando a inexigibilidade na
emissão da fatura relativa ao mês de junho/2016 e os
danos daí advindos. 2. Em análise aos autos, cumpre
registrar que a falha na prestação do serviço restou
minimamente comprovada pela autora com a
demonstração de que a fatura do mês de 06/2016
muito superior à média dos meses anteriores, ao passo
que a parte ré não produziu qualquer prova que
pudesse elidir as pretensões da parte autora quanto à
regular medição, ônus que lhe incumbia a teor do artigo
373, II do CPC/15. 3. Isto é, verifica-se que o consumo
médio da autora com base nos meses anteriores girava
em torno de 100 KWh, no entanto, a fatura do mês
questionado foi de 2.321 KWh, muita acima da medição
média, não tendo a ré logrado êxito em comprovar a
legalidade de tal aumento do consumo de energia, até
porque sequer pugnou pela produção de prova pericial.
4. Sendo assim, correta a r. sentença ao determinar a
revisão e emissão de nova fatura referente ao mês de
junho/2016 em valor equivalente ao consumo médio
mensal dos últimos 12 meses anteriores ao referido
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
8
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
mês, bem como a abstenção em cortar o fornecimento
do serviço, conforme tutela deferida. 5. No que diz
respeito ao dano moral, no caso, apesar de não ter
havido interrupção no fornecimento de energia à
residência da autora, nem negativação de seu nome, a
autora teve que suportar incremento indevido em sua
conta a fim de evitar a interrupção do serviço. Ademais,
aplicável à hipótese a Teoria do Desvio Produtivo do
Consumidor, através da qual o fato de o consumidor
ser exposto à perda de tempo na tentativa de
solucionar amigavelmente um problema de
responsabilidade do fornecedor e, apenas
posteriormente, descobrir que só obterá uma solução
pela via judicial, consiste em lesão extrapatrimonial
(Reclamação administrativa - protocolo n.
000193174501). 6. O valor da reparação fixado em R$
5.000,00 (cinco mil reais), não merece reparo, uma vez
que compatível com os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade. Enunciado nº 343 TJRJ. 7.
Precedentes deste Tribunal. Mantença do julgado.
RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.”
“XXXXX-70.2020.8.19.0210 – APELAÇÃO - Des (a).
BERNARDO MOREIRA GARCEZ NETO - Julgamento:
22/06/2021 - DÉCIMA CÂMARA CÍVEL - Consumidor.
Fornecimento de energia elétrica. Recuperação de
consumo. Imposição de parcelamento nas faturas
mensais. Cobranças excessivas nos meses de maio e
novembro/2019. Suspensão do serviço. Inexistência de
provas técnicas demonstrando erro na medição de
consumo. Ônus da concessionária. Falha na prestação
do serviço configurada. Dano moral caracterizado.
Indenização adequada: R$ 5.000,00. Precedentes
deste Tribunal de Justiça. Súmula 343 desta Corte
Estadual. Apelação da concessionária desprovida pelo
relator.”
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Quinta Câmara Cível
9
Apelação Cível nº XXXXX-26.2019.8.19.0203
Diante do exposto, VOTO NO SENTIDO DE DAR PARCIAL
PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO, tão somente para reduzir o
valor da indenização por danos morais para R$ 5.000,00 (cinco mil reais),
mantendo-se, no mais, a sentença tal como lançada.
Rio de Janeiro, 09 de novembro de 2021.
Desembargadora DENISE NICOLL SIMÕES
Relatora